Ação da Polícia Federal apura emissão de títulos de crédito falsos, bloqueia R$ 12,2 bilhões e leva Banco Central a decretar a liquidação extrajudicial do Banco Master. Em Brasília, BRB vira alvo de buscas e vê sua gestão sob pressão
Brasília, 18 de novembro de 2025 – A Polícia Federal deflagrou, na manhã desta terça-feira (18), a Operação Compliance Zero, uma das maiores investigações recentes contra crimes financeiros no país. A ofensiva mirou o Banco Master e operações bilionárias envolvendo o Banco de Brasília (BRB), apurando um esquema de emissão e negociação de títulos de crédito falsos no Sistema Financeiro Nacional.
Ao todo, a Justiça Federal expediu cinco mandados de prisão preventiva, dois de prisão temporária e 25 mandados de busca e apreensão, cumpridos no Distrito Federal, Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Bahia.
O principal alvo é o banqueiro Daniel Vorcaro, dono do Banco Master, preso no Aeroporto de Guarulhos (SP) quando, segundo a PF, se preparava para deixar o país em um jato particular com destino à Europa.

Fraude de até R$ 12 bilhões, segundo a PF
Em depoimento à CPI do Crime Organizado, no Senado, o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, afirmou que as fraudes financeiras investigadas na Compliance Zero podem chegar a R$ 12 bilhões. O cálculo leva em conta a emissão de títulos de crédito e carteiras de recebíveis considerados falsos ou sem lastro, negociados dentro do sistema bancário.
Segundo a PF e o Ministério Público Federal (MPF), o esquema teria funcionado em duas etapas principais:
- Criação de carteiras de crédito “fantasmas” – O Banco Master teria declarado a existência de carteiras de empréstimos e recebíveis sem comprovação suficiente de que os clientes de fato existiam ou tinham capacidade de pagamento.
- Revenda para outra instituição financeira – Essas carteiras foram revendidas ao BRB, que pagou pelos ativos, gerando caixa imediato para o Master. Mais tarde, diante de questionamentos do Banco Central, esses créditos passaram a ser atribuídos a outras empresas, em uma espécie de “engenharia contábil” para tentar dar aparência de regularidade às operações.
De acordo com documentos citados na investigação, só em uma das operações, o fluxo financeiro associado ao Master e ao BRB teria alcançado R$ 12,2 bilhões, dentro de um volume ainda maior de negócios que somou R$ 16,7 bilhões entre julho de 2024 e outubro de 2025.

Pilhas de dinheiro, joias, carros de luxo e obras de arte
Além das prisões, a operação desta terça-feira também teve um forte componente de apreensão de bens. Em diferentes endereços ligados aos investigados, a PF recolheu:
- R$ 1,6 milhão em espécie, encontrados em dinheiro vivo na casa de um dos executivos do Master;
- Carros de luxo;
- Relógios de alto padrão;
- Obras de arte e outros itens de alto valor.
As imagens das pilhas de notas contadas por agentes federais repercutiram nas redes sociais e reforçaram a dimensão do caso, que já é tratado por investigadores como um dos maiores escândalos bancários da história recente.
Banco Central liquida o Banco Master
No mesmo dia da operação, o Banco Central (BC) anunciou a liquidação extrajudicial do Banco Master e da Master Corretora de Câmbio, Títulos e Valores Mobiliários. Na prática, o banco é retirado do sistema financeiro e passa a ser administrado por um liquidante nomeado pelo BC, com poderes para levantar ativos, verificar passivos e organizar o pagamento a credores.
O BC justificou a medida citando grave crise de liquidez e violações relevantes às normas prudenciais, apontando que a situação da instituição se tornou “irrecuperável” dentro das regras do sistema financeiro.
Com a liquidação, o Fundo Garantidor de Créditos (FGC) passa a ser responsável por ressarcir correntistas e investidores dentro do limite previsto em regulamento (habitualmente até R$ 250 mil por CPF ou CNPJ, por instituição, para produtos cobertos como CDBs e depósitos à vista). O fundo já informou que só iniciará os pagamentos após receber a base de dados do liquidante, o que deve ocorrer em etapas.
Importante: a fintech Will Bank, que também integra o conglomerado Master, não foi liquidada pelo BC e segue em operação, à espera de eventual venda para novos investidores.

O papel do BRB e o impacto para Brasília
Se, de um lado, o Master é liquidado, de outro, o Banco de Brasília (BRB) passa a figurar no centro das atenções – especialmente para o público do Distrito Federal, onde a instituição é um banco público e um dos principais patrocinadores de clubes e projetos esportivos, culturais e sociais.
A PF afirma que a chamada “Operação BRB-Master” – o conjunto de negócios firmados entre os dois bancos – teria ocorrido por “pura camaradagem” e como tentativa de “abafar” a fiscalização do Banco Central sobre o Master.
Segundo o MPF, o Master teria adquirido carteiras de crédito de uma empresa ligada a um ex-funcionário e, em seguida, revendido esses ativos ao BRB sem efetuar pagamento prévio, recebendo do banco público valores que, em parte, teriam origem em recursos de servidores e clientes do DF.
Em consequência direta da Compliance Zero, o presidente do BRB foi afastado do cargo por decisão judicial, e a PF cumpriu mandados de busca e apreensão na sede do banco, em Brasília.
Meses antes, em setembro, o Banco Central já havia vetado a tentativa de compra do Master pelo BRB, avaliando que a operação representava risco excessivo para o banco público e poderia contaminar a instituição com passivos do Master que não seriam objeto da aquisição.
Com a nova operação da PF, a pressão política sobre o governo do DF e sobre a gestão do BRB aumenta. Autoridades locais, parlamentares e órgãos de controle devem cobrar explicações detalhadas sobre como essas operações foram aprovadas internamente e qual o nível de risco assumido com recursos de um banco controlado pelo poder público.
Quem são os principais investigados
Além de Daniel Vorcaro, apontado como controlador do Master, a PF também tem como alvos:
- Ex-sócios e diretores do banco, entre eles o baiano Augusto Lima, ligado ao setor financeiro e a figuras da política nacional;
- Outros administradores e executivos responsáveis pela área de crédito e estruturação de operações;
- Pessoas jurídicas usadas para dar aparência de legalidade às carteiras de crédito suspeitas.
Todos responderão por crimes como gestão fraudulenta, gestão temerária, lavagem de dinheiro e organização criminosa, entre outros previstos na legislação do Sistema Financeiro Nacional. A defesa dos envolvidos, até o momento, tem evitado declarações públicas ou nega as irregularidades – o espaço segue aberto para manifestações.
O que está em jogo para o sistema financeiro
A combinação de prisão do controlador, fraude bilionária, liquidação extrajudicial e envolvimento de banco público transforma a Compliance Zero em um teste de estresse imediato para o sistema de garantias bancárias do país. Especialistas ouvidos por analistas de mercado apontam que:
- O caso pode se tornar referência para a atuação do Banco Central em crises futuras, assim como foram as intervenções em bancos como BVA e Panamericano no passado;
- A forma como o FGC conduzir os ressarcimentos será observada de perto por investidores de varejo, que vinham buscando bancos médios em troca de taxas de juros mais altas;
- O episódio tende a reforçar a discussão sobre governança e compliance em bancos públicos, em especial quando se envolvem em operações complexas com instituições privadas em situação delicada.
Para o cidadão comum, a principal mensagem prática é: quem tinha dinheiro aplicado no Master precisa acompanhar, passo a passo, o cronograma divulgado pelo FGC e pelo liquidante – e desconfiar de promessas de “resgate mais rápido” feitas por terceiros.
Próximos passos da investigação
A Polícia Federal ainda deve aprofundar a análise de documentos apreendidos nas sedes do Master, do BRB e de empresas ligadas ao esquema, além de quebras de sigilo bancário e fiscal já autorizadas pela Justiça.
Os investigadores trabalham para responder a algumas perguntas-chave:
- Quem assinou e autorizou as operações mais sensíveis dentro do BRB e do Master?
- Qual foi a real origem dos recursos movimentados nas carteiras de crédito suspeitas?
- Houve participação de outros bancos, fundos ou empresas fora do núcleo já exposto?
- Que tipo de responsabilidade recairá sobre gestores públicos e sobre conselhos de administração envolvidos?
As respostas a essas questões podem determinar não apenas o futuro dos envolvidos, mas também a forma como o sistema financeiro brasileiro tratará, daqui para frente, operações estruturadas com bancos médios e fundos de investimento.








































